PALAVRA DO PÁROCO
O
motivo pelo qual se aprende tanto cada vez que se lê O Pequeno Príncipe, na
minha opinião, é que ele fala sobre a construção de relações que não são
aquelas que comumente vivenciamos no mundo de hoje.
Não
estou falando sobre vidas alheias. Estou falando de mim, de você e de quase
todas as pessoas ao nosso redor. É incrível o quanto a gente é capaz de se
distrair com detalhes e deixar que o mais importante se perca. É triste, triste
demais!
“Tu
és eternamente responsável por aquilo que cativas”
É
uma máxima simples. Somos responsáveis por aqueles com quem criamos laços. Mas
por quê?
Porque
o nosso coração, quando cultivado, fica mais sensível a tudo o que vem daquela
pessoa. Porque o que ela diz passa a ter um significado diferente, porque o que
ela é passa a importar muito mais do que o que são os outros. Porque o carinho,
as críticas, as vontades, as escolhas, as atenções, tudo isso passa a ser muito
mais importante.
“A
gente só conhece bem as coisas que cativou. Os homens não têm mais tempo de
conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas”.
Não
temos mais tempo de conhecer coisa alguma. Não dá para conceber isso! Quem não
tem tempo de ir ao aniversário do amigo, quem não tem tempo pedir desculpa,
quem não tem tempo de mandar um e-mail, quem não tempo do repiauer com os
amigos, quem não tem tempo de almoçar com a família, quem não tem tempo de
pensar sobre o mundo, quem não tem tempo para amar, quem não tem tempo para
lutar pelos seus ideais… será que tem tempo de viver?
Outra
questão é disposição. Somos cada vez mais comodistas. Queremos bastante,
lutamos pouco, realizamos menos ainda. Mas cativar requer disposição,
precisamos ter atitude, iniciativa, prestar atenção! Precisamos gastar energia
(e para isso precisamos ter energia para gastar).
Não
dá, mesmo, para fazer tudo e ao mesmo momento. Mas não estou falando de
grandiosas obras! Estou falando de atitudes que podem demorar alguns segundos,
poucos minutos ou umas horas, no máximo. Será que o que ocupa o nosso tempo
atualmente é mais importante (seja para a sobrevivência ou por alimento a alma)
do que aquilo que deixamos de fazer? Será que estamos gastando energia no que
realmente vale a pena?
E, o
mais importante, qual é a consequência destas nossas atitudes em relação às
pessoas que cativamos? Obviamente elas nos perdoam. Foram cativadas. Mas o
quanto será que estaremos afetando a sua crença em relação ao mundo, a amizade,
ao quanto ela pode contar com você, ou quanto sua presença é real. É bom
sonhar: mas viver os sonhos é melhor ainda. Nada substitui a presença, que às
vezes se manifesta pela simples disponibilidade da outra pessoa em partilhar
com você. Sim, quantas vezes temos corpos ao nosso lado e pessoas distantes, e
quantas vezes temos corpos distantes e pessoas ao nosso lado?
Levo
dentro de mim todas as pessoas que me são especiais. Mas a própria felicidade
de carregá-las no coração contém, intrinsecamente, uma certa angústia pelas
limitações diretas que me impedem de tê-las por perto.
Não
quero deixar isso acontecer comigo. Não quero deixar de ter tempo ou energia
para cuidar daqueles que cativei.
Mas
as escolhas não dependem só de mim. Tentarei entender o momento e o contexto de
cada um, e tenho consciência de que, às vezes, os caminhos levarão as pessoas
para longe, sim. O problema é que essa consciência não faz doer menos.
Pe Magnus Camargo
é Mestre em Teologia pela
PUCRS
e Coordenador Diocesano de
Pastoral